terça-feira, 8 de março de 2011

A morte do pombo

Então como que do nada, os pássaros recomeçaram a dar sinais em minha vida. Há muitos, muitos anos, me ensinaram a ler o voo dos pássaros. Faz tanto tempo que não lembro mais bem como era... algo relacionado à quantidade de pássaros que avistamos no céu.

De todo modo importa pouco. Sempre deixei os pássaros [e não as aves de um modo geral] para um plano secundário. Gosto explicitamente dos cães, e sou a favor de pássaros fora das gaiolas. O que logicamente não impede que eu já tenha tido um casal de periquitos e um coleirinho, e havia um melro na casa dos meus avós paternos. E um papagaio na casa da mãe da minha mãe.

Agora, quase nesse instante, tem um bem-te-vi na janela comendo banana. Pelo que entendi, a minha mãe coloca um pedaço de banana todos os dias na janela, e o passarinho vem comer. Recordo que não gosto dos bem-te-vis; esse, contudo, me pareceu bastante simpático. O suficiente para chamar a minha atenção para o fato de que os pássaros, em todas as formas, estão de volta.

Geralmente associados à fragilidade e à impermanência, em minha vivência, os pássaros costumam me lembrar que as coisas são finitas, que vão e vêm sem precisão. As coisas não são precisas, e os pássaros remetem a isso. Tudo pode deixar de ser de uma hora pra outra, ou pode vir um vento forte e levar o passarinho para outra direção.

Diferente do filme do Hitchcock, no qual os pássaros surgem sem qualquer motivo, normalmente noto a presença dos animais de asas quando estou em algum tipo de entrave pessoal. Minha crise, dessa vez, não é exatamente pública. Ela existe, mas veio intrincada de um modo que ainda não achei a solução simples para resolver o fato. Ela existe e me deixou mais duro e bem menos sociável. Tendo em vista que dar as caras não está na lista de meus esportes favoritos da vez, a situação anda bastante complexa.

Mas vamos à cena. Descendo da casa da minha avó, perto da praça da cidade, um bando de pombos no meio da rua, alvoroçados. Todos agrupados provavelmente em volta de alguma comida. Todos no meio da rua, sem se importar com o resto do mundo. Veio um carro, atropelou e matou um dos pombos. E eu vi. E eu ouvi o barulho da asa se quebrando, eu vi a morte do pombo. Estranhamente o carro atropelou o único pombo branco do bando.

Não chorei pela morte do pombo, mesmo tendo sido cruel, mas não gosto de mortes de animais. Não mato galinhas [o que não quer dizer que eu não seja carnívoro – ou hipócrita, como queiram], não gosto de touradas. Nem de pescar eu gosto. Mas não chorei pelo pombo. Porque seria, de certa forma, chorar por mim mesmo, e ainda não é a hora disto. O pombo. Ali, estatelado. O pombo foi de certa forma mais um sinal, avisando que está na hora de seguir adiante. Que ficar parado, no meio da rua, mesmo que seja em torno de um monte de comida, é pedir para ser atropelado, ainda que inconscientemente.

Então façamos valer o sacrifício do pombo e tentemos, ainda que seja apenas tentativa, deixar toda uma falsa segurança de lado e buscar algo além. Afinal, para que servem as asas?