sábado, 16 de outubro de 2010

Sobre o amor: re[in]flexões

Uma das grandes mentiras vendidas em loja é o jogo de cama de casal 4 peças: dois lençóis, duas fronhas e só. Jogo de cama (de casal) deveria ter no mínimo um lençol extra, para evitar que um roube o lençol do outro no meio da noite. Não sei como era no tempo de nossas avós, mas tenho cá comigo que essa ideia de duas pessoas sob um mesmo pano deve ter nascido com o conceito de amor romântico, aquele inventado em algum começo de século.

Vejamos a tradição amorosa anterior à literatura romântica – aquela com amores impossíveis, tragédias arrebatadoras e melodramas de cortar o coração, escritos por Shakespeare, Tomás Gonzaga (o da Marília de Dirceu), Glória Magadan e Janete Clair, entre outros.

Amores se arranjavam, amores eram desvinculados da instituição casamento. O ato de casar era visto como negócio que, e principalmente, por ser negócio, durava toda uma vida. O convívio entre os arranjados viria a tornar a relação, se não sólida, suportável na maioria das vezes. Assim como nos dias de hoje, relacionamentos abusivos existem, e aqui quero enquadrar a questão apenas da maioria, deixando para dramaturgos a função de explorar melhor as donzelas fugidas com cavaleiros e as escravas raptadas tornadas senhoras de engenho.

Casamentos [não amores] davam certo, duravam. Amores, como a expectativa de vida, eram aventuras de curto prazo e algumas lágrimas.

Até que alguém resolveu dar nome e sentido ao conceito de amor que temos hoje: esse que passa na novela e termina quase sempre em final feliz. Também dá as cartas no que chamamos comédia romântica, nas literaturas de banca de revista (Bianca, Sabrina, se é que ainda vendem isso), na programação do rádio. Tudo ou quase fala de amor, da expectativa do amor, da realização do amor e dos felizes para sempre sobe o letreiro.

A questão, claro, não é o encantamento inicial. Vive-se um tempo em que casamento continua sendo negócio [não duvide], porém com uma margem de risco superampliada e a inevitável sensação de que vai dar errado a qualquer momento. Por que seria, pergunto.

Se temos maior acesso a informação, maior possibilidade de escolha [rá, maior possibilidade implica também em mais chances de erro] e principalmente liberdade de escolha, qual a razão de um relacionamento por definição livre, iniciado pelo conceito externalizado do Amor, ou seja, nos moldes da educação sentimental pregada pelos melodramas, se somos pessoas privilegiadas por conseguir reunir as condições idealizadas por uma gama de autores ditos românticos, qual a razão para tudo de repente ir por água abaixo?

Pergunta que respondo assim: pela ampla falta de respeito próprio. Entenda, não digo que as pessoas não se respeitam mais umas às outras, talvez até se respeitem mais do que deveriam. Porém esqueceram-se de se dar o respeito. Eu mesmo, mea culpa, assumo, sou um intenso desrespeitador de mim. Não levanto limites, não imponho barreiras e, grave erro, aceito muita coisa sem discutir. Conviver é ceder em partes, com algum tipo de contrapartida. Mas quando se cede demais é como aquela famosa historinha: anteontem mataram o gato e não fiz nada, hoje voltaram e queimaram a minha casa, violentaram minha mulher e eu... Permaneci fazendo nada.

Não há mais nada o que se fazer. Apenas dar chance ao fim e a um possível recomeço, seja qual for. Recomeçar é sempre bom e necessário. Sem nunca, claro, abandonar o que se aprendeu. Por agora tenho uma grande vontade de fim. E deixo uma dica para quem for montar casa: compre um lençol extra para todo jogo de casal. Por ora, agora, fim.

2 comentários:

shikida disse...

lembre-se das instruções do avião. ao caírem as máscaras de oxigênio, coloque primeiro em você e só depois coloque nos outros ;-)

Flávio St Jayme disse...

Adorei esse texto...
Abs amigo