sexta-feira, 9 de abril de 2010

Brasileia

Estou verborrágico. O que vem a ser um problema quando eu deveria estar trabalhando e não pensando algum texto. Mas o fato é que o escrito sai a hora que ele quer. Eu praticamente psicografo tem certas horas. Para em outras ficar suando uma linha medíocre qualquer.

O fato é que estou atormentado.

Porque fui chamado de nacionalista.

A minha primeira defesa é que não, eu não saio por aí de cocar e tambor defendendo o Juca Pirama, o pau-brasil e o Macunaíma. Até porque a Semana de Arte Moderna passou tem quase oitenta anos. Muito menos visto camisa pró qualquer tipo de purismo ou puritanismo.

Porém preciso assumir que me acabei tornando um tanto nacionalista mesmo. Ou pelo menos falando mais sobre o produto interno.

Tipo. O melhor livro que li esse ano de 2010 foi mesmo o Galiléia. Recomendo a qualquer um. Ouço Angela Maria, Ney Matogrosso, Dolores Duran, Elis Regina, Rita Lee, Klébi Nóri, Teresa Cristina, Rita Ribeiro, Maria Bethânia. Gilberto Gil. Chico Buarque. Fui em um dos últimos shows do Chico Science e adorei quando assisti a um show vazio da Paula Lima. Acho ponto de macumba coisa de uma musicalidade fantástica. Mais da metade das músicas que tenho em casa é mesmo cantada em português brasileiro. Já gostei mais de Jorge Amado e acho as novelas do Sílvio de Abreu, junto com as do Gilberto Braga, quase sempre excelentes. Queria ser amigo da Danuza Leão e uma vez perguntei à Fernanda Young se fumar sálvia dá mesmo barato (o que me rendeu uma dedicatória "É verdade, mas não espalha" em um livro que perdi). Adoro a Denise Stoklos, admiro demais o trabalho dos meninos do Luna Lunera. Gosto de feijoada e fui criado com goiabada cascão da minha avó. Quando escolhi o buffet de um coquetel, preferi purê de mandioquinha em vez de vols-au-vent. Amo cachaça e frango com ora-pro-nóbis, que na minha cidade é conhecido como lobrobrô. Coleciono música brega.

A lista não teria final hoje, e eu poderia terminar fazendo um manifesto Brasil-te-amo, com chapéu de cangaceiro e defendendo o artesanato do Vale do Jequitinhonha. O que não vai acontecer. Porque não gosto do artesanato do Vale, isso é público.

Porém não é só isso. Olha a contrapartida.

Sou fã de literatura descartável: crepúsculo, Harry Potter, Percy Jackson, diários de vampiro, Meg Cabot. Livros de faroeste e detetive, daqueles de bolso (alguns escritos por brasileiros, mas tudo com nome estrangeiro). Leio (ou li) Maurice Druon, Joseph Campbell, Fritjof Capra, Kafka, Garcia Márquez. Amo Bergman, escrito e filmado, e para mim Fanny & Alexander é o melhor filme de todos os tempos. Mais que Cidadão Kane. Queria ter sido amigo da Audrey Hepburn e adoraria contracenar com Meryl Streep. Milk-shake é uma invenção perfeita, eu tomaria um por dia se isso não me transformasse em um barril ambulante maior do que já sou. Adoro cinema francês e Edith Piaf, já comi escargot e gostei. Provavelmente viveria muito bem em Paris, Londres ou Praga. Gosto de Beatles, fui no show da Madonna, no dos Rolling Stones e me carregaram certa vez para o Deep Purple (mas desse não gostei). Chorei quando vi a Diamanda Galás. Arrependo até hoje de não ter ido ao show do Rufus Wainwright praticamente na porta da minha casa só porque estaria cheio demais e não foi quase ninguém. Ouço ABBA, Donna Summer e adoro disco music, principalmente para dançar. Coleciono dvds de séries americanas e amo desenho animado.

Mas não gosto de metal pesado, não gosto do Iron Maiden e acho Oasis e Sigur Rós um porre. Também não gosto de house, ou sei lá o que toca nessas festas que a gente entra, sai, e parece que não mudou a música hora nenhuma.

Daí que, para encerrar, eu me lembrei de uma conversa com uma historiadora amiga minha, a Adalgisa.

– Tá bom, Adalgisa. Ouro Preto é barroco. Mas e Ponte Nova, onde nasci, é o quê?
– Aquilo lá é ecletismo, uai!

E ficamos assim.

Um comentário:

Anônimo disse...

Mania que as pessoas tem de ficar colando etiquetas na testa dos outros. Eu ando numa fase não tão nacionalista assim, mas ainda choro ouvindo Maysa e outro dia, vendo um programa, me lembrei do quanto gosto de Cazuza.
Cada um tem o direito de gostar do que quer, e ser feliz com isso (desde que não incomodde os demais, como esses loucos que passam na minha rua com o rádio no talo ouvindo funk e calypso).
Não sei se foi o seu caso, mas tentar pagar de cult tanto elogiando só o que é daqui quanto só o que é de fora é uma baita de uma burrice. O mundo inteiro tá cheio de coisa legal, e a gente tem mais é que curtir. (Nossa, falei demais.)