Blogs. Lugares bons para se permanecer exposto a quem não quer, e esconder os escritos de quem realmente interessa. Lembro que quando comecei meu antigo blog de regime – já comentei isso antes – passeei por outros similares e vi que tudo parecia livro de autoajuda. Eu hoje pesei, emagreci 100 gramas, e rios de comentários elogiando. Eu hoje estou triste, porque pesei (de novo) e engordei 200 gramas, e rios de comentários dando força. Lembro bem que tive de parar de ler aqueles blogs para não ter bulimia nervosa, de tanto enjoo que me deu. E para não escrever para as mulheres pelo amor de deus não se pesem de 10 em 10 minutos.
Optei por descrever fatos: fazer regime é uma porcaria, chocolate é bem mais legal mas como era ou emagrecer ou morrer e eu estava gostando de viver resolvi fazer dieta. Passou? Não, gente como eu vai viver de regime, mas agora importa menos e quero pensar coisas além. Ontem a intenção era tentar ser mais leve. Textualmente falando.
O que não vai ocorrer por agora. Portanto, se você quer mensagens positivas e coisas fofa, procure por fotos da Anne Guedes, clicando nesse link.
Limites e traumas. Por volta dos 17 anos cometi um grave erro. Tenho, desde 1995, uma conta no Banco do Brasil. Na época com um limite de R$500 que, por conta de um cheque pré-datado fora de hora, mais um depósito que não foi feito no dia certo, estourou em um real. Isso, eu ultrapassei o limite do cheque especial em R$1. Foi esse o erro? Não. E se eu contar que uma tia minha, na época, trabalhava no banco, ficou sabendo por sei lá que motivo, e num aniversário, festa de família, me passou um sabão em público porque eu passei do limite do cheque? E se eu contar que o meu erro foi não ter ido ao banco na segunda-feira seguinte denunciar? Pois é.
Esse erro de não ter denunciado a minha tia ao banco custou caro. Dá-se a liberdade, hoje eles chegam e cortam um pedacinho, amanhã arrancam seu braço e reclamam depois de arrancar sua cabeça fora.
Moro em BH desde 1992, e sempre tive de ceder meu quarto para uma visita: essa mesma tia. Ela chegava, eu tinha de sair do quarto. Todos os outros não, dormiam (dormem) na sala... Durante uma crise de família (coisas do ápice da decadência pela qual passamos fim dos anos 1990), essa mesma tia chegou a gritar comigo que "os homens da família não serviam pra nada e só faziam coisa errada". Ponha "dinheiro" no contexto da afirmativa. Nesse dia tive meu primeiro ato de revolta (lembrei imediatamente da cena do banco), e fui embora para a casa da minha mãe, outra cidade, sem avisar. Mas só. Puseram panos quentes e deu-se como se nada tivesse acontecido.
A coisa começou a ficar "menos simples" quando, uma vez, eu estava sozinho aqui na cidade (para quem não sabe moramos eu e outra tia, dividimos as contas, mas a família tem a chave de casa) e eu soube en passant que essa mesma tia (sim, é a mesma mesmo – a que, como minha mãe fala, construiu uma casa imensa sem quarto de hóspedes) viria para Belo Horizonte. Alguém me avisou? Não. Deixei o seguinte comentário: que ela chegue comigo fora de casa. Porque a porta estaria trancada a ferro por dentro e, se alguém tentasse entrar, eu ia chamar a polícia. Meia hora depois recebi um cordial telefonema avisando que visitas iriam chegar.
Nada contra visitas, a propósito. Adoro. Muito principalmente quando elas avisam que virão e dá tempo de arrumar a casa, colocar alguma comida na geladeira, fazer um bolo, essas coisas que só quem é de Minas vai entender.
A falta de limites durou até janeiro de 2009 (estando eu, portanto, aos 31 anos). Cheguei do cinema e estavam, minha tia e a filha dela, dormindo no meu quarto. Assim: fui pra rua, voltei, tinha gente no meu quarto. Não sei se foi a idade, não sei se era a primeira semana do regime, as dores no corpo da academia, o fato de eu estar com cem quilos, ou quinze anos de revolta no meio do caminho. Liguei a televisão, duas da manhã, bem alto. Bem, bem alto. Comecei a gritar, bater porta, como se estivesse doido ou bêbado (não bebi, era sessão meia noite de filme e eu tinha começado a tomar fluoxetina já). Literalmente urrava. Até que ela levantou, tirou a filha e saiu do quarto, e fui dormir (metaforicamente, não preguei o olho de tanto ódio) na minha cama.
Dia seguinte meio que fui "forçado" a pedir desculpas. Mas desde então meu quarto é meu, só meu, mesmo agora eu dormindo mais fora de casa do que nela. Demorou tempo demais para eu começar a justificar que não sou como "os homens da família" e não tenho mais 14 anos há muito tempo. Hoje a gente se respeita. Como comentei com uma amiga ontem, lá em casa não somos o tipo de pessoa que fica anos sem se falar por nada. A conversa com ela gerou todo esse texto levíssimo de hoje. Que por sua vez me lembrou de uma coisa: eu preciso ensinar a alguém, do meu jeito, que é preciso, sim, respeitar os mais velhos e que não tem jeito de viver sem engolir um sapo ou dois. Mas que não devemos nunca, nunca mesmo, deixar de denunciar, na hora, se alguém quebrar seu sigilo bancário numa festa.
* O título do post é inspirado no filme do Carlos Saura (1977), que por sua vez tem o título baseado na expressão cría cuervos y te sacarán los ojos. Nada mais adequado. Afinal, "não entendo por que dizem que a infância é a época mais feliz na vida de alguém"...
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Um comentário:
Ser o arquétipo do pai, eis a minha função :D
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