quinta-feira, 25 de março de 2010

Da honestidade

As pessoas que nasceram no fim da década de 1970 no Brasil pegaram, em sua infância, o movimento Diretas Já, eleição e morte de Tancredo Neves e mais uma grande crise econômica que levou a certa perda de poder aquisitivo da então classe média. Quem não se lembra dos preços tabelados, ou ainda das corridas aos supermercados em busca de preço baixo, com direito a estocagem doméstica de produtos? Eu lembro muito bem de, na casa da minha tia, ter uma parte do maleiro do armário cheia de papel higiênico e latas de leite condensado.

Ao mesmo tempo, as crianças dessa época foram as primeiras "vítimas" de uma revolução nas propagandas, com um alto investimento em produtos e seus respectivos anúncios voltados ao público infantil. Não esqueça a minha Caloi, chicletes Ploc, Clube do Bocão da gelatina Royal, concurso da maionese Hellman's para dar um robô que era a cara do C3PO (e até hoje lembro o nome que venceu: Jecanauta). Não sei se havia alguma regulamentação na época, sei que eu via muita tevê e que sim, a mídia levava os filhos a infernizarem seus pais atrás de porcarias definitivamente indispensáveis. A coisa foi evoluindo e com o tempo, já com a entrada do Conar, comerciais como os da tesourinha do Mickey saíram de cena.

Como um bom nascido em 1977, e com 33 anos prematuramente assumidos (na verdade só faço 33 em julho), fui uma dessas "vítimas". E como toda boa criança infernal (e mimada), tive acesso, quando possível, a um monte de besteiras. Como aquele estojo paraguaio horrível que a gente apertava botões e os compartimentos abriam. Quem nunca viu a monstruosidade de perto? Eu tive um, e era rosa.

Obviamente esse introito não é justificativo para um delito que cometi na infância: eu roubei um ovo de páscoa. Não me perguntem a razão, talvez pela crise econômica, ou talvez por ter sido uma criança gorda, o fato é que nunca ganhei, de criança, um ovo de páscoa. Entendam como ovo de páscoa aquilo que fica dependurado no teto das Lojas Americanas, o pequenininho não vale. Foi exato assim: entrei no supermercado, peguei o ovo e saí. Claro que todo mundo viu, só que na minha cabeça eu estava fazendo algo erradíssimo (continua sendo erradíssimo), mas que ninguém teria como descobrir.

Escondi o ovo por alguns dias na casa da minha tia, disse que tinha sido presente de alguém, só o comi no domingo de páscoa. Passei uns bons tempos sem me confessar, para não contar ao padre que tinha roubado um ovo de páscoa, e acho que o perdão desse crime veio em alguma confissão comunitária, aliás o meu tipo preferido até hoje. Eu e Deus resolvemos o assunto sem precisar dizer ao padre, geralmente amigo da minha mãe, os muitos pecados cometidos.

Ter roubado aquele ovo de páscoa, ao contrário do que pode parecer, não me transformou em marginal. A "culpa" daquele ovo ainda é tão grande que antes eu tivesse tomado uma surra naquele tempo. Simplesmente ninguém disse nada. Nada. Até hoje não sei, aliás, mãe, você que está aí me lendo agora, sabia que eu já roubei um ovo de páscoa? Enfim. Depois que mudei para Belo Horizonte, descobri que praticamente todos os meus colegas de colégio já tinham roubado bombom nas Lojas Americanas e o peso da culpa diminuiu.

Porém o castigo do ovo existiu e não foi uma grande dor de barriga (o ovo, acho, até que era gostoso): eu virei uma pessoa automaticamente honesta. Como se houvesse algo superior me vigiando e esperando a minha próxima escorregadela. Exemplo: na semana passada fui buscar um pedido de radiografia para uma amiga e o porteiro do prédio me entregou um envelope, daqueles de depósito em banco, com dinheiro dentro. Eu não raciocinei quanto à possibilidade de ir embora com o envelope. Foi instantâneo: "Não, moço, eu vim buscar o envelope da Dra. Alessandra, sala 319, não é esse". Mesma coisa outro dia no restaurante: o dono digitou errado o valor, R$10 a menos, avisei o erro. Virei um chato. Devolvo troco a mais, corro atrás de gente que esquece a bolsa no ônibus, e nunca achei dinheiro na rua para ter a oportunidade de pensar se devolvo ou não ao dono. Provavelmente devolvo, se souber quem é o dono, claro.

Da mesma forma não sou afeito a injustiças, em todos os níveis e seja com quem for. Alguns trâmites da vida, que alguns encaram como "simples" ou "normais", podem virar extremo sofrimento para mim, quase como psicopatia. O errado ganha extrema relevância, grita como sirene de polícia em meu ouvido. O que me levou a afirmar que não trabalho para o Edir Macedo, nem por um milhão de dólares ao mês. Vai contra a minha índole.

A questão do ovo também levou a outra válvula de escape. Agora que posso, todo ano passo nas Lojas Americanas e compro ovos de páscoa. Aliás esse ano vou fazer diferente, não vou comprar. Minha irmã vai ficar mais triste, mas paciência. Vou usar o dinheiro do ovo para outra coisa qualquer, e terá provavelmente o mesmo efeito. É uma tentativa de superar um lugar-comum da minha geração nos dias de hoje. Se você tem por volta dos 30 anos, dê uma conferida no que tem comprado que com certeza vai achar coisas idênticas, com os mesmos personagens, ou muito parecidas com aquelas que você não podia ter na infância. Ou você acha mesmo que lançaram os dvds do He-Man para as crianças de hoje poderem assistir?

17 comentários:

shikida disse...

Vc acha que foi o ovo ou sua educação católica que te levaram a cultivar a honestidade?

Allysson disse...

Ah, então, os ovos que você não deu viraram os DVDs do He-Man? Me empresta? ;)

Anônimo disse...

Caramba, lembrando dessa promoção da Hellmann's do robo, foi que eu cheguei ao seu post, Coloquei no google, pois queria saber se alguem tambem se lembrava disso.Fiquei anos puto com o nome que ganhou, e isso me marcou! Jecanauta!!KKKK. Agora parece engraçãdo, mas queria matar quem deu esse nome, achava o meu : Hell-bot! muito melhor! Valeu, abço!
Leonardo Pichara

Unknown disse...

Eu achei este Sítio-Teia, usando o nome Jecanauta! Sim, eu não uso estrangeirismo como a maioria do povo que não pensa e gosta de ser escravizado!
Em 1984 eu achei ridículo ter ganho aquêle nome ridículo! Eu não lembro agora o nome que eu mandei, mas posso lembrar depois. E com certeza era bem melhor que aquêle! Eu queria muito ter ganho aquêle robô principal, ou pelo menos aquêles robôs da Estrêla parecidos com C3PO, que não lembro o nome! Eu lembro que aqueles dourados eram chamados de Arthur, mas eu gostava mais dos outros cujos comandos eram nas cabeças deles. Se pá, acho que ninguém ganhou aquêles robôs de brinquedo! Aquela era mais uma promoção furada!
Mas uma vêz eu ganhei uma mochila da promoção da Kichute. Eu acho que eles só dão materiais baratos.

Anônimo disse...

Incrível, fiz uma busca usando o maldito nome que deram para o robô da promoção da maionese e caí neste blog. Sinceramente, pensei que só eu lembrava disso. E, apesar de ter apenas nove anos à época, o nome "Jecanauta" me deixou extremamente desapontado - e muito puto da vida,também.

Anônimo disse...

Foi na busca desse robô da Hellmann's que cheguei à este blog.Tinha 10 anos na época. Os robozinhos eram o Percival da Estrela. Eu era louco para ter um destes.

Anônimo disse...

Caros
Recentemente consegui a propaganda da Hellmans convocando para participar da promoção do dito Robô! no melhor estilho guerra nas estrelas lá aparecem os percivais e o Jecanauta (esqueceram de dizer que era um concurso paulista)! quem tiver interessado me mande um email que remeto com o maior prazer! francaalencar@yahoo.com.br

Anônimo disse...

Moro em São Luis do Maranhão e minha irmã (na época com 12 anos) ganhou um robõ desses da promoção da Hellmans. O nome que ela deu foi 'Hellminon". Na ocasião nós também ficamos muito chateadas porque o ganhador do 1° premio foi o que deu o nome jecanauta, mas a gente entendeu depois. Ainda não se havia saído totalmente da ditadura e jeca remetia ao patriotismo do jecatatu. Acho que foi isso. No dia que a Kombi chegou procurando pelo nosso endereço foi uma festa só. Foi muito mesmo. A criançada da rua foi toda na nossa casa, pra conhecer o robô com o genius na cabeça. ha, ha, ha! Hoje a minha irmã mora no Rio de Janeiro.

eu disse...

não lembro que nome eu dei, mas também lembro desse nome ridículo, tô procurando imagem do robô p mostrar p meus filhos, vc tem Alguma?

Anônimo disse...

Procure por "robo percival" no google.

Saudade demais desse robozinho.

Unknown disse...

Também cheguei aqui por que lembrei de repente do nome vencedor desse concurso e queria saber se o oráculo Google me daria alguma informação. Também achei o nome muito sem graça, pode até ter sido coisa combinada. Ganhei um dos robôs Percival que eu tinha em casa até uns anos atrás, mas a carcaça dele começou a se desfazer. A propósito, o nome que me fez ganhar o Percival foi Hellmanix 2001.

Unknown disse...

Eu fui uma das ganhadoras e ainda tenho e funciona

Unknown disse...

O nome que ganhou foi Jecanauta , o que mandei foi sinfrônio

Unknown disse...

Chegou em casa no dia do meu aniversário

Unknown disse...

Nossa eu tenho o meu e funciona , passo lustra móveis nele e assim o plástico não estraga

Unknown disse...

Me chamo sueli

João Maria Machado disse...

Ganhei um Atari, na promoção para dar um nome a um mini buggy. O meu nome foi VelociHellmann's.